Casa Máy > As Melhores Partes - Posts > autoras > Escrevendo no escuro – Patrícia Melo (resenha 2)

< voltar

Escrevendo no escuro – Patrícia Melo (resenha 2)

Postado às 13:49 do dia 19/06/12

A razão de eu ter lido este livro de contos de Patrícia Melo foi escrever uma resenha para participar da Oficina de Crítica Literária promovida pela Biblioteca Pública do Paraná nos dias 14, 15 e 16 de junho. Luís Augusto Fischer, que viria dar a oficina, pediu que escrevêssemos uma crítica sobre um livro de autor nacional lançado de 2009 pra cá e outra sobre Machado de Assis. Li três livros de autoras contemporâneas para fazer a crítrica: Escrevendo no Escuro, Pó de Parede, e Vento Sul. Os comentários a estes livros estão todos publicados aqui no As Melhores Partes. Mas foram comentários engraçadinhos, que nem posso chamar de crítica literária.

Aliás, a oficina foi ótima, muita obrigada. No final das contas, Luís Fischer não pôde vir e quem o substituiu foi João Cezar de Castro Rocha, professor de Literatura Comparada da UERJ. Ele não comentou sobre as resenhas que fizemos na pré-inscrição, mas fez um exercício de resenharmos um conto do Miguel Sanches Neto, Então Você Quer Ser Escritor? (2011), e o livro O Filho Eterno (2007), de Cristovão Tezza. Ficamos com autores paranaenses. Para o conto de Miguel, reescrevi minha resenha três vezes. Sou persistente. Recebi um crítica muito salutar do João: “Não seja dominada por seu estilo, domine-o” e custou-me 48h para entender o que, afinal, ele queria dizer.

Lendo os comentários que venho postando neste blog, entendo que em todos estou sendo dominada pelo estilo. Mas deixo como está: existe uma faceta irreverente, brincalhona, irônica e sarcástica que a gente deixa aparecer ou se aborrece. Mas quero ir colocando resenhas sérias aos poucos por aqui. Começo redimindo-me com o livro de Patrícia. Abaixo coloco a resenha original, escrita antes da postagem de 15 de maio. É esta, a original, feita para a Oficina, mas sem retoques, que você lerá.

 

***

 

ESCREVENDO NO ESCURO

de Patrícia Melo

(2011, Rocco)

Amarrada a produtores e atores, a roteirista e escritora Patrícia Melo disse, em entrevista ao programa Entrelinhas (2010), que gosta mesmo é de escrever literatura, onde se solta. Escrevendo no Escuro, seu primeiro livro de contos, enfrenta o desatino de escrever de forma autônoma, quando a conclusão é que espalhamos âncoras pela escrita, ainda que aleatoriamente.

O livro parte de uma mitologia muito querida a escritores: que seus personagens não lhes pertencem e que as histórias que escrevem se desenrolam à revelia de seus desejos:

Daqui, dessa trincheira – é assim que gosto de chamar o meu local de trabalho, com suas camadas e camadas de livros e papéis, formando um recife à minha volta – daqui, como Hades, planejo tudo sozinha. Não há outros sócios ou parcerias possíveis. Sou o vórtice que leva os personagens ao seu destino. Sou responsável por cada gesto e cada fala. Quando minha tropa de fodidos abre a boca, o grito é meu. Eu decido. Eu digo ataquem. Destruam, e eles destroem.

Então esta narradora, talvez doente pelo esforço de dominar aquilo que solapa autores mais desatentos, percebe que algo lhe escapa: Cecília. Cecília tanto pode ser uma personagem que se materializa vindo de dentro de seu livro, quanto seu duplo, quando não apenas o efeito de noites mal dormidas. Patrícia não quer que seja fácil o embate entre Cecília e sua criadora, nem que seu leitor tenha certeza de que são duas oponentes de fato ou a mesma pessoa dividida.

Primeiro sabemos que Cecília quer se matar por amor – e se mata de fato –, quando sua criadora decide que não é esta a sequência da trama e a faz ressurgir. Mas como na física quântica, em que todas as possibilidades de um átomo coexistem até que o observador fixe uma delas, Cecília permanece morta e não morta pelo livro. Ou se lê Escrevendo no Escuro como um romance estropiado, preso aqui e ali pelo paradeiro de Cecília; ou como contos que foram se unindo, onde Cecília não faz o papel da cola – cada conto tem seu quinhão de sordidez, esquisitice e anormalidade suficientes para mantê-los juntos –, mas sim o papel da intrusa, que nos lembra de sua morte ainda não investigada.

Entre o crime – a morte de Cecília –, e a conclusão do inquérito, desenrolam-se treze narrativas do absurdo da vida. Diante de um crítico literário frustrado; um rock star canceroso; uma amante de mentira; um cataloguista perturbado; um detetive com síndrome do pânico; uma depiladora chantagista; uma radiologista que assedia suas pacientes; um perito necrófilo; uma faxineira que come cobaias de laboratório; chats online para assassinos e suicidas; uma agnóstica que escapa de acidente aéreo; um tapa que vem como carma; e duas irmãs que trocam destinos – o que sobra ao leitor de Patrícia é continuar até o fim, mesmo que tendo somente a perplexidade para levá-lo de uma página a outra.

 

revisto por Mayra Corrêa e Castro ® 2012

 

MELO, Patrícia. Escrevendo no escuro. Rio de Janeiro: Rocco, 2011.

COMPRE ESTE LIVRO NA AMAZON

Posts Relacionados

Comentários

Assinar Newsletter