Casa Máy > As Melhores Partes - Posts > biografia > A infância do mago – Hermann Hesse
Você já deve ter lido Sidharta (1922), ou Demian (1917), ou O Lobo da Estepe (1927); mas este A Infância do Mago (1973) tem menos probabilidade: é que a coleção Sabor Literário traz “textos pouco conhecidos de autores consagrados”, uma escolha certeira pra quando quer apreciar um escritor fera – muitas vezes Nobel de Literatura – , sem despender dias de leitura. Dessa coleção, já passaram por aqui O Mundo do Sexo, de Henry Miller, e Feia de Rosto, de Arthur Miller. Agora trago o relato confessional de um sujeito que, sendo alemão, naturalizou-se suíço, e, filho de mãe indiana missionária protestante, rompeu com a família porque não queria se tornar pastor e foi colocar as filosofias orientais em toda a sua obra.
Publicado postumamente, A Infância do Mago traz um narrador plasmado em Hesse (1877-1962), criança, que sonhava ser mágico e se deslumbrava com uma estátua de Shiva Nataraja que havia em sua residência. Fonte inesgotável de mistérios, a biblioteca do avô, orientalista, surge como mundo-vasto-mundo tentador, ao passo que os armários da mãe, fornidos com sedas da Ásia, apontavam-lhe que o carinho estaria em terras distantes. Pra tornar tudo mais mimoso, o narrador ainda confessa receber a visita de um homenzinho – como se fosse um gnomo se estivéssemos na tradição celta.
Se tomarmos a história como autobiográfica, por mais que o narrador tenha crescido e não tenha se tornado um mágico, Hermann se tornou: de sua cartola saíram fábulas, contos, romances que encantam. Mas se lermos o texto no que ele é, crescemos e… ficamos chatos. Ah, não, não fui condescendente: o narrador não diz que ficamos chatos. Apenas passamos a nos interessar por sexo e ele nem sempre está disponível. Tá, vai ler o livro e tire você as conclusões.
Abaixo um trechinhos fofos.
Misticismo
“Pais e professores não foram os únicos a me criar: tive outros mestres também, poderes mais altos, secretos e misteriosos (…)” (p. 17)
– Gosto demais de “poderes mais altos”.
Adultice
“Mas o que eu queria mesmo era ser mágico. Era esse meu pendor mais profundo e íntimo, fruto de uma certa frustração com o que chamavam ‘realidade’ e que às vezes me parecia ser apenas uma tola convenção dos adultos (…)” (pg. 18-19)
– Não é que seja chato ser adulto – é que não nos deixam ser crianças quando crescemos.
“Outra vez, meu pai ralhou comigo por uma estrepolia qualquer. Eu mal e mal me expliquei, novamente sofrendo com a dificuldade de fazer um adulto entender as coisas.” (p. 30)
– Ai que alívio. Achei que era só a gente que sofria fazendo as crianças entenderem as coisas.
Super poderes
“Tinha especial admiração pela arte de se tornar invisível e queria muito dominá-la.” (p. 19)
– Não conheço viv´alma que não sonhe ficar invisível.
Tantra
“Meu pai não conversava com a minha mãe em línguas da Índia, mas em inglês e num alemão puro, claro, de leve colorido báltico. Foi com essa língua que ele me atraiu, conquistou e educou; eu procurava imitá-lo, sôfrego e cheio de admiração, sôfrego demais, talvez, pois sabia que minhas raízes estavam em solo materno, em seus olhos escuros e em seu mistério. Minha mãe era toda música, mas meu pai não sabia cantar.” (p. 26)
– Que termos haveria de comparação entre Alemanha e Índia?! A batalha foi perdida já no nascimento do rapaz.
revisto por Mayra Corrêa e Castro ® 2013