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“Le Jardin des Caresses” foi o livro traduzido por Franz Toussaint, do árabe pro francês, que escolhi traduzir pro português em 1995 pra que o Prof Paulo Ottoni me aprovasse na eletiva de tradução e eu estivesse mais perto de me formar Linguista.
Naquela época, eu estava mais interessada em “traduzir” pro final do século XX o que lia nas revistas da imprensa feminista do final do séc. XIX do Arquivo Edgard Leuenroth, material que eu estudava há 2 anos sob orientação de Margareth Rago. Eu era uma linguista na História.
Mas traduzir aqueles poemas árabes que misturavam misticismo e sensualidade foi experiência libertadora, porque senti que gostava de me responsabilizar por escolhas, as escolhas que todo tradutor faz, a escolha de abrir mão de um sentido pra guardar o sentido que ele julga ser o maior. Com Ottoni aprendi duas coisas: primeiro, que traduzir é se rebelar; segundo, que traduzir é se submeter. Me senti bem com essa dicotomia, foi uma sensação natural viver esta briga de opostos.
Traduzir – eu acho, e nisso meus comparsas linguistas podem dizer o que pensam -, eu acho que traduzir é o que a linguística é no seu âmago: traduzimos sons em fonemas, traduzimos a dominância em norma culta, traduzimos esquemas mentais em gramática.
Mas não me tornei uma tradutora profissional, apesar de, em algum momento depois das aulas com Ottoni, eu ter querido. Mas traduzo. Desde que me tornei uma “não-formada em saúde” ensinando aromaterapia, traduzo este conhecimento pra quem tem o primeiro, ou segundo, ou terceiro contato com ele. É o que estrangeiros fazem: traduzem quando em terra estrangeira. Embora eu viaje pouco no sentido literal (medo de avião), nunca estive em “casa”, mas sempre num campo de conhecimento estranho ao meu de origem (a linguística).
Então eis que a Editora Laszlo me deu duas oportunidades de voltar pra casa: as traduções de dois livros da farmacêutica especialista em aromaterapia Danièle Festy. A coisa que me deu mais trabalho nestas traduções foi pesquisar os nomes botânicos das dezenas de plantas que ela recomenda no livro quando indica fitoterapia. Não havia o nome botânico. Se já é um inferno a gente “traduzir” o nome comum pro botânico em português, imagina o pesadelo disso em língua que nos é estrangeira.
E a coisa mais difícil foi traduzir o sentimento que franceses têm em relação às doenças de que padecem, porque cada povo dói diferente. Descobri que nós, brasileiros, tratamos a doença, o padecer de uma doença de forma muito mais medicalizada e técnica que franceses (como trazidos pela Festy, como Festy os enxerga). Nós somos “informados em demasia”, nós somos mais “embulados” (de bula) que o povo francês (tal como passa Festy – é sempre a visão do autor, sempre).
Então manter este tom – naïve muitas vezes – foi a decisão que tomei pras duas traduções. Mantive-o sobretudo pra resguardar o impacto que será – tenho certeza disso! – ler franceses usando OEs puros, a 50, 75% de diluição na pele, embaixo da língua, usar supositórios com OEs, como se fosse a coisa mais natural possível.
Não há ordens no livro de Festy, é tudo uma conversa com um leitor que está consultando o livro na busca do alívio pra dor que sente. É – na acepção do termo francês usado pra englobar todas as práticas integrativas e complementares – uma medicina doce. Brasileiros não têm a experiência de uma medicina que seja doce – exceto quando se consultam com homeopatas -, e manter esse sentimento da consulta com um médico “doce” foi o maior desafio meu com ambas as traduções.
O que traduzi, então, foi o sentimento de que dor se cura com amor, ainda que haja princípios ativos farmacológicos por trás. Esta foi a escolha pela qual me responsabilizei nas traduções de Festy.
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A Editora Laszlo – o trabalho de Camilla Koscky e Fabian Laszlo – deixará um legado disruptivo em informação sobre saúde complementar. E me sinto honrada e grata por contribuir nesta empreitada, um trabalho liderado por ambos, mas que envolve um time comprometido com o mesmo propósito: revisores, diagramadores, capistas. E tradutores – traduzindo dor em amor através da aROMAterapia: A AMOR TERAPIA.
Beijo, Mayra.
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